Uma parte de mim está onde tu estás, é a brisa que te cumprimenta...
 quando sais pela manhã, essa brisa que sopra devagar e faz mais le-
ves e mais livres os teus passos. 
 Uma parte de mim é a luz paciente do sorriso que ofereces aos que
 sofrem, aos que esperam, mas sobretudo aos que interrogam, aos
 que nunca desistem de procurar, àqueles que não disfarçam a fome
 de saber.
 Uma parte de mim é o decidido caminho que tomas quando tens de
 escolher entre vários, e a tua intuição é, nesse momento, talvez a
 coisa mais importante que há no mundo.
 Uma parte de mim é o teu profundo olhar sobre o pequeno mapa da
 grandeza humana, a mais rápida forma de medir a distância das es-
trelas no limitado universo de cada um de nós.
 Uma parte de mim é a tua sombra, essa estreitíssima sombra que voa
 nas asas jovens do arroz, onde o desejo continua a escrever doridas
 cartas de amor para uma alma líquida que flutua, ferida, sobre as tu-
as colinas interiores.
 Uma parte de mim é o lobo que roçaga as tuas pernas, que te acom-
panha e te protege, mas que não vês, não sentes, não sabes, e não
 tens consciência sequer de o ignorar.
 Uma parte de mim é uma parte de ti, uma sede longínqua, longa, re-
pleta do que a cada um de nós apetece, do que cada um de nós ne- 
cessita, do que a cada um de nós pertence, essa sede que faz mais
 justos os teus gestos e mais demorados os teus beijos.
 Uma parte de mim acorda quando tu partes e deita-se quando tu che-
 gas, é o anjo que tem o sorriso franco dos mais pobres e a alegria
 dos sinos que acordam as raízes da infância.
 Uma parte de mim é a canção que tu cantas nas longas caminhadas
 junto ao mar, a erva indefesa que tu pisas, a dor que sentes por ter
 acordado uma vez mais num tempo injusto, o pensamento branco
 que diriges até Deus.
 Uma parte de mim é tudo o que rejeitas, tudo o que te fere, tudo o
 que te queima, tudo o que te é insuportável. Tudo o que ainda não
 é capaz de merecer-te.
Joaquim Pessoa
segunda-feira, 20 de janeiro de 2014
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