Nas alturas mais complicadas da minha vida escrevo os melhores capítulos.

Não há passos perdidos.


domingo, 26 de julho de 2020

Nós sabemos sempre quando não cabe nas palavras.

domingo, 19 de julho de 2020

Sim, é preciso coragem



Hoje resolvi abrir uma cápsula do tempo.
Faz 20 anos que a tinha fechado.
É é incrível como éramos com vinte anos menos.
As fotografias é que são um murro no estomago.
Os Slides como prova para complemento da história.
Voltar a ver-me, de cabelo à rapaz, leve e feliz.
Os guias de viagens,
o mundo era aberto e a vida pela frente.
Restos de frascos de perfume, que não me perturbaram.
Postais, ainda se escreviam tantas cartas,
isqueiros, fósforos,
os convites do baile de gala.
Bilhetes cheios de lágrimas e risos.
Livros brancos escritos de poesia,
conchas do mar e búzios,
restos de rosas...
quebradas, como se quebrou a inocência,
que é o que mais me custa ter perdido.
Tudo era intenso e infinito como só se pode ser nessa idade.
Suspirei fundo,
recordo que em criança perguntava à minha avó porque suspirava ela tanto,
- a vida é uma ilusão dizia-me.
Já percebi.
Voltei a selar a caixa,
mas desta vez libertei dois livros que lá tinha encerrado,
o Amor - Marguerite Duras e Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada, Pablo Neruda.
pode ser que daqui a outros vinte anos eu os saiba de cor e tenha aprendido alguma lição.



Dois amantes ditosos fazem um único pão,
uma única gota de luar sobre a erva,
ao andar deixam duas sombras que se reúnem,
deixam um único sol vazio numa cama.
De toda as verdades escolheram o dia:
não se ataram com fios mas com um aroma,
e não despedaçam a paz nem as palavras.
A ventura é uma torre transparente.
O ar, o vinho vão com os dois amantes,
a noite oferece-lhes suas pétalas ditosas,
a todos os cravos têm eles direito.
Dois amantes ditosos não têm fim nem morte,
enquanto vivem, nascem e morrem muitas vezes,
têm a eternidade que é da natureza.
Pablo Neruda
The Taste Of Índia
Já passam das dez da noite, num julho covidico e eu e os meus apetites de última hora.
Sabores indianos.
Saio sem demoras e esperanças.
Vale que tenho um restaurante indiano em frente de casa.
Vale que ainda não fechou.
Vale que tem uma mesa cá fora à minha espera.
Vale que tem comida indiana caseira,
Vale que tenho o estômago rijo para o que der e vier.
Vale que aguento o picante, do indiano que me serve e do que tenho no prato.

sábado, 18 de julho de 2020

A imagem pode conter: uma ou mais pessoas, oceano, ar livre e água

O carrocel desbotado

Não! começo pelo não, esta palavra poderosa, tal como o Sim! 
Mas mais, se for sentida como nenhum sim.
Poupa tempo e gastos desnecessários de energia.
O "Não" é o novo Black para todas as horas.
Dito por nós e ouvido por nós em todas as esquinas.
Ficamos à porta.
Já não se entra em parte alguma ou em ninguém.
Mesmo a custo para quem cresceu livre no Verão Azul.
Somos crianças feitas para grandes férias, como dizia o Ruy Belo.
E de repente, num dia normal como noutro qualquer da nossa vidinha, ouvimos a noticia remota de que mais um virús. E vem mais outro e outros mais virão a caminho.
Não fosse isto um penico, o problema seria só deles.
Mas além disto ser um penico, é um penico que anda à roda.
Ainda acredito que,
CADA FIM É UM INÍCIO.
Apenas andávamos distraidos, e quando andamos distraidos é que elas acontecem.
Salto coletivo para o desconhecido, mas o que é que é conhecido?
Se o que era já não é.
De repente tudo adquire um significado diferente. As crises pessoais ou gerais servirão para nos nivelar.
O valor de uma coisa apenas é proporcional à nossa energia gasta nesse despêndio de concretização.
Instável. Por isso tudo será sobrevalorizado.
Mas o que se pode construir em baralhos de cartas?
EU QUE NEM SEI JOGAR!
Tenho as mãos pequenas e vazias.
Aprendo de letra a "Construção" do Chico Buarque. 
Quero mergulhar em silêncio, e vir ao de cima desfocada e miúpe como sempre e não encontrar a toalha. Que deveria estar cheia de areia e rodeada de gente.
Mas regresso do mar e vejo o vazio nos olhos alheios. Tateio nestes passeios desconhecidos.
O absurdo. As enchentes que restam da onda de adolescentes a quebrar as proibições.
AS OBRIGAÇÕES da máscara a cada segundo.
Não fico em casa pela minha saúde.
Ainda preciso muito de ar fresco.
De solidão também se morre. 
Não quero metros a medir carinhos.
A minha régua nunca foi a uso.
Os nossos T2 na cidade não possuem jardins à beira mar plantados.
E não há para onde fugir. Não se trata de fronteiras.
Mas as BARREIRAS.
Como e quando é possivel um sim?
E a coragem de O viver, que ainda que não me falte, terei de O sentir por inteiro.
E estamos todos aos cacos partidos.
4h da tarde de um fim de semana irrespirável, nem os carros circulam.
Apenas os cavalos e os Cow-boys no deserto do Oeste Americano continuam, que numa América ainda há muitas, e os terrenos e os dias por lá são grandes se estivermos sem sede e com sorte fora da mira dos olhos abutres ávidos de restos e de sangue.
Nenhuma descrição disponível.
Fazer de um dia um acto de coragem,
Ir ao café do bairro,
Ao mercadinho,
Falar com os vizinhos,
Comprar pão e vinho,
O cinema que não pode mais esperar,
Voltar à solidão de carregar o congelador,
O Verão em estilo closet,
Sunset pelo canudo, mas que se lixe!
eu preciso de esplanadar!
São as novas rotinas,
Num sábado, como outro qualquer de 2020! Nunca tão 2 e 2 foram 4!
E eu, que até sou mais de letras que de números!
"como é possivel falar de uma coisa que é para se ver?"
Vieira da Silva~

Don't Mention The War

The Swing Shouters - When I Get Low I Get High


Notas de rodapé, numa sexta de um Julho quente, mas não tão quente como deveria.
A propósito deste novo estado de actualidade,
a dor de cotovelo deixou de ser indicativa da “dor” a que era referente. Nesta realidade pode indicar exactamente o oposto. Até chegar ao absurdo de pensar que “ainda nos resta o cotovelo!”
Desejo chegar ao fim do dia com os ditos doridos.
Os que eram de abraços e toques como eu pensarão o mesmo.
Os distantes, que se inibiam de fazer pontes físicas estarão nas nuvens.
Mas as histórias que caminham não se fazem de distantes, mas de calorosos presentes. Nenhum homem é uma Ilha.
Que não nos faltem e falhem então os cotovelos, que pouco contacto físico nos resta, entre sorrisos escondidos e olhos embaciados e desfocados à espreita.
Que o medo esteja apenas de visita, que não faça disto ninho ou bandeira.
Deixaremos?
Eu não❣️


 

segunda-feira, 13 de julho de 2020

domingo, 12 de julho de 2020

A imagem pode conter: texto que diz "COMO SI SE PUDIERA ELEGIR EN EL AMOR COMO SI NO FUERA UN RAYO QUE TE PARTE LOS HUESOS Y TE DEJA ESTAQUEADO EN LA MITAD DEL PATIO."
"Decía Cortázar: 'No elegís la lluvia que te va a calar hasta los huesos cuando salís de un concierto'. 
Al ver a (...) sentí eso. No elegí: amé. Llovió encima de mí".
Juan Villoro.

The windmills of your mind - Alison Moyet (lyrics)

You Will Always Be Lonely

Arcade Fire - Keep The Car Running w lyrics

PUBLIC - Make You Mine (Official Lyric Video)

sábado, 11 de julho de 2020

"Envelheço com a nómada solidão das aves."
Al Berto

É frequente acontecer-me, com uma nitidez tal que confunde e mistura o passado num presente. 
De repente não estou aqui mas em Barrancos. Num momento de registo casual, tinha chegado de ir buscar água fresca à Fonte da Pipa, que era a melhor água do mundo, enchia o piporro do avô Mendes, que lavava as garrafas de vidro para as voltar a encher, umas de água outras de vinho. Comi pão com queijo fresco e sal. Fui à rua, ouvi-me a gritar Ehhh...Tia Ângela!!, era a vizinha dos meus avós da casa da frente. A manhã que tinha sido fria adivinhava a tarde ardente. Era aquela hora antes do almoço onde ainda se podia andar na vizinhança. O barulho das andorinhas na rua. E tanta claridade. Teria 12 ou 13 anos. De vestido rodado, infantilizado e saltitante. Pálida e magrinha como só era eu. A risca feita ao meio da cabeça, os ganchos grandes de cada lado firmavam a teimosia dos arrepios num cabelo mal cortado, castanho, fino e escorregadio. Usava óculos de massa maiores que a cara fina. E uns enormes olhos claros e absorventes, que guardaram tudo. De tal forma que ainda hoje sinto o longo corredor escuro, fresco e o cheiro do encerado, vejo a luz ao fundo, oiço as gargalhadas da Tia Ângela, que se sentava com os braços roliços cruzados sobre o farto peito a contar histórias que eu gostava de ouvir. Vejo os sinais grandes que tinha na cara. Os óculos pequenos, finos de haste preta só em cima. Os contrastes. E aí percebi o conforto duma Alma alegre num corpo satisfeito. Deve ser por isso que não parei de engordar.
Ah sim... já sei o que fui lá fazer, aguardava o Sr. Constantino que estava para chegar do talho. Traria as costeletinhas de borrego, partidas fininhas como só ele, que eu levaria para a Avó Pura cozinhar. Não tornei a provar. O Amor de avó não se replica.

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Road Trip With Nena

A imagem pode conter: Rita Garro e Madalena Ferreira Da Cunha, pessoas a sorrir, closeup e interiores
Só isso se guarda: o amor e as palavras.
Ele continuará a existir em ti, porque o amor tem o dom de permanecer debaixo da pele e no brilho dos olhos de quem o guarda.
Só isso se guarda: o amor e as palavras.
A coragem de os viver por inteiro.

Inês Pedrosa
A imagem pode conter: texto que diz "Estamos sós com tudo aquilo que amamos."

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Tudo o que tenho
não tem posse:
o rio e suas ocultas fontes,
a nuvem grávida de novembro,
o estilhaçar do riso em tua boca.
Só me pertence
o que não abraço.
Eis como eterno me condeno:
- amo o que não tem despedida.
Mia Couto