Nas alturas mais complicadas da minha vida escrevo os melhores capítulos.

Não há passos perdidos.


sábado, 30 de junho de 2012

História de Cão


eu tinha um velho tormento
eu tinha um sorriso triste
eu tinha um pressentimento

tu tinhas os olhos puros
os teus olhos rasos de água
como dois mundos futuros

entre parada e parada
havia um cão de permeio
no meio ficava a estrada

depois tudo se abarcou
fomos iguais um momento
esse momento parou

ainda existe a extensa praia
e a grande casa amarela
aonde a rua desmaia

então ainda a noite e o ar
da mesma maneira aquela
com que te viam passar

e os carreiros sem fundo
azul e branca janela
onde pusemos o mundo

o cão atesta esta história
sentado no meio da estrada
mas de nós não há memória

dos lados não ficou nada


Mário Cesariny
"Afinal o que importa é não ter medo!"

Mário Cesariny

Rodrigo Leão - Mário Cesariny / Queria de ti um país (English subtitles)

quinta-feira, 28 de junho de 2012

"Lo contrario del amor no es el ódio, sino la indiferencia."

Freud
CLARICE LISPECTOR, in ÁGUA VIVA (Francisco Alves Editora. 11ª. Edição, RJ, 1990).


Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não-palavra – a entrelinha – morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma vez que se pescou a entrelinha, poder-se-ia com alívio jogar a palavra fora. Mas aí cessa a analogia: a não-palavra, ao morder a isca,... incorporou-a. O que salva então é escrever distraidamente. (p.25)

No Se Nada

Vhils

Tenho em mim todos os sonhos do mundo.

[Fernando Pessoa]

imagem: Vhils

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Tomás Colaço

En realidad dentro de mi corazon, siempre existe este derby entre Portugal y España!

terça-feira, 26 de junho de 2012

Quase todas as pessoas que se Divorciam ficam mais magras, mais elegantes, mais bonitas, rejuvenescem,... está provado, talvez por comerem menos... e, estive a pensar por questões ligadas à necessidade de estarmos mais apelativos, disponiveis aos outros, daí mais atractivos. Regressam as Leis da Atração, o Enamoramento, a Caça e o Acasalamento! E isso os torna mais Felizes! Pena que o Ser Humano sempre insatisfeito...rapidamente acabam outra vez no Casório, na Acomodação, bandalheira do Corpo, Espirito e Sentimentos, e em nome do "Amor"!

segunda-feira, 25 de junho de 2012

domingo, 24 de junho de 2012


Acrílico sobre tela: Freewheelin, de Luis Ludzska

Pé na Terra - Quero mais é sentir...

"A Vida não volta a servir os mesmos pratos. Muitas das oportunidades que se perdem no momento ficam perdidas para sempre."

Jacques Arènes

Frank Sinatra - Moon River

"Um homem pode viver 3 dias sem água, mas nenhum sem poesia."

Oscar Wilde

quinta-feira, 21 de junho de 2012

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Olhos nos Olhos

«Chega-se a ser grande por aquilo que se lê e não por aquilo que se escreve.» Jorge Luis Borges
 

Dizem que amanhã vem aí o Verão!

AMIGOS, COM SOPHIA E A MAGIA DA SUA MANHÃ, VOLTAMOS À POESIA.
UM BOM DIA!

LT e CC

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in LIVRO SEXTO  (Moraes Ed, 1962) e OBRA POÉTICA (Caminho, 2010)


Como um fruto que se mostra
Aberto pelo meio
A frescura do centro
Assim é a manhã
Dentro da qual eu entro


*

Photorealistic Oil Paintings of Fruit, por  Dennis Wojtkiewicz

*

(LT)

terça-feira, 19 de junho de 2012

Caro Miguel Esteves Cardoso (MEC)



Sem querer fugir ao assunto, começo por dizer que não o conhecer pessoalmente é um caso de manifesta injustiça.
Tenho livros seus lidos em quantidade suficiente para o merecer. Conhecimento de crónicas bastante para isso já ter sucedido.
Horas de Noite da Má-Lingua. Visitas ao Pastilhas.
Fui assíduo na leitura d' O Independente e fiel comprador da revista K. Consulto com frequência Em Portugal não se come mal e Com os Copos. Prefiro as suas traduções das peças de Samuel Beckett.
Por causa da sua letra ainda ouço Foram Cardos Foram Prosas (com música de Ricardo Camacho, interpretada por Manuela Moura Guedes).
O que concede ainda mais força à ideia de injustiça. Penso que pelo menos um gin tónico consigo já se justifica há anos.
Posso ser acusado de exagero, de ser tudo demasiado aparatoso. Mas em relação a certas coisas, tenho mau perder. E não concordo, em absoluto, com certos privilégios.
Se a memória não me falha, também nunca nos cruzámos. À excepção de uma vez nas Amoreiras. Que eu me recorde! Penso que confirmará.
Nunca fomos além de um «com licença». Mas é possível simpatizar com alguém sem nunca o ter conhecido, verdadeiramente. Concordar com as suas ideias só por as ter lido num jornal. À primeira. Dispensar troco. Achar que sim senhor. Querer tudo de bom para si, só porque sim. É o que sucede no meu caso. No nosso…
Essa é, pelo menos, a minha opinião. Podemos construir um mundo inteiro baseado em suposições e ele funcionar. Ou, pelo menos, termos essa sensação. Mesmo que tudo não passe de uma ilusão. As certezas estão sobrevalorizadas.
Sei que tem passado um mau bocado. A razão é do conhecimento geral. Não são precisas mais explicações.
Que tem sofrido. E eu tenho sofrido junto. Menos, como é óbvio. Por simpatia. Por ter a sensação de que nos conhecemos desde sempre. Sem nunca nos termos cruzado. Por pensar que lhe estou a dever. Por achar que consigo sentir, também.
Foi graças a si que achei que também conseguiria escrever. Penso até que tem uma geração inteira (pelo menos) que o responsabiliza pelo mesmo. Por sua causa deixei de ter tento na língua. Senhor do meu nariz. Passei a não comer e calar. Aprendi que ninguém merece ser, antecipadamente, levado em ombros. A escrever sobre isso. Como se fosse uma emergência. Foi a altura em que, provavelmente, mais me cresceu pelo na venta.
Acabei a ler nas entrelinhas. Mais desinibido nos temas. Desenvolto na gramática. Atento à sintaxe. Escrever parecia fácil. Por sua causa parecia uma coisa simples. Depois percebi que não e levei isso um bocado a peito. Como se tivesse invadido uma festa para a qual não fui convidado. Temi não ter entrado com o pé direito. Ser fruto de um erro de casting.
Já lá vão uns anos.
Senti-me traído. Capaz de vazar os próprios olhos. Não se ilude assim as pessoas. Só porque somos bons. Deve-se explicar que não é para todos. Que não funciona assim. Durante muito tempo acusei a quebra do voto de confiança.
Demorei algum tempo a perdoar-lhe, mas aprendi consigo uma coisa ou outra sobre o amor e, embora tenha resisitido, isso acabou por acontecer. Que é fodido. Para começar. E isso compensou tudo o resto. A desilusão anterior. Afinal, fui eu que me pûs a jeito. Como costuma dizer: «a culpa é sempre nossa.» E talvez o segredo seja mesmo a alma do negócio.
Mais recentemente, enquanto sofria consigo, percebi pelas suas palavras que amar nunca deixa de ser fodido. Por esta ou aquela razão. Já desconfiava. Mas há sempre uma lição ou outra a tirar. A aproveitar dos outros. De si.
Coragem MEC, sem a sua ajuda nunca teria conseguido escrever esta carta.
Obrigada por tudo.


Carta Retirada do Blogue Máquina da Preguiça
http://maquina-da-preguica.blogs.sapo.pt/21655.html

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Fernando Pessoa

LIBERDADE

Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
... Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.
 

Sophia de Mello Breyner Andresen

"Wind" by Zoltan Toth

Fotografia de José Luis Outono

domingo, 17 de junho de 2012

O Tempo Vale Muito Mais do que o Dinheiro

Perder tempo não é como gastar dinheiro. Se o tempo fosse dinheiro, o dinheiro seria tempo.
Não é. O tempo vale muito mais do que o dinheiro. Quando morremos, acaba-se o tempo que tivemos. Quando morremos, o que mais subsiste e insiste é a quantidade de coisas que continuam a existir, apesar de nós.
O nosso tempo de vida é a nossa única fortuna. Temos o tempo que temos. Depois de ter acabado o nosso tempo, não conseguimos comprar mais. Quando morreu o meu pai, foi-se com ele todo o tempo que ele tinha para passar connosco. As coisas dele ficaram para trás. Sobreviveram. Eram objectos. Alguns tinham valor por fazer lembrar o tempo que passaram com ele - a régua de arquitecto naval, os relógios - quando ele tinha tempo.
As pessoas dizem «time is money» para apressar quem trabalha. A única maneira de comprar tempo é de precisar de menos dinheiro para viver, para poder passar menos tempo a ganhá-lo. E ficar com mais tempo para trabalhar no que dá mais gosto e para ter o luxo indispensável de poder perder tempo, a fazer ninharias e a ser-se indolente.
A ideologia dominante de aproveitar bem o tempo impede-nos de perder esses tempos. Quando penso no meu pai, todas as minhas saudades são de momentos que perdi com ele. Uma noite, numa cabana no Canadá, confessou-me que o único filme de que gostava era «Um Peixe Chamado Wanda«. Todos os outros eram uma perda de tempo. Perdemos a noite inteira a falarmos e a rirmo-nos disso. Ainda hoje tem graça.

Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Público

Vicente Mais ou Menos de Souza: Verdade, verdadinha

 ...Numa altura em que os relacionamentos estão e estarão na ordem do dia, ou seja a ocupar as nossas mentes cada um com os seus problemas... ocorreu-me dizer que não há vencedores nem vencidos nestas "querelas" e que a maior luta é connosco próprios.

Esta é a verdade verdadinha.

Na sua maioria as pessoas até sabem o que está em jogo. Aceitar é que se torna complicado!

Na maior parte das vezes são as próprias pessoas que estão em processo de libertação, crescimento, mudança, mas têm medos, vai contra tudo o que idealizaram na vida e tira-as da zona de conforto.

Verdade, verdadinha, uma relação amorosa tem que significar crescimento, liberdade de se ser, prazer e paz para os dois.

Se se enumerar o que a relação com o outro(a) trás : a calma de uma rotina, os filhos dos dois, o facto de se sentirem amados, a ideia de que tudo está como devia estar, o hábito, a situação financeira, os amigos e a envolvente social, o companheirismo de anos, o arrumar de "coisas", o sexo e muito mais... há, no entanto, um factor que perturba tudo isto, as emoções complementares, que nos magoam, que nos desequilibram.

É aqui que se torna importantíssimo que as pessoas se conheçam amplamente, que saibam aceitar enganos, ilusões, receios, traumas, e que convivam com o que são hoje, despidos e desmascarados.

 Ilustração: La foscor de la nit, de vegades, es com la solitud interior, por d'Ha Jin, in Pinzellades al món, Cataluña
 
"Não nos devemos preocupar em viver muito, mas sim em viver plenamente; viver muito depende do destino, viver plenamente, da nossa própria alma. Uma vida plena é longa quanto basta."

Séneca

sábado, 16 de junho de 2012


“Em caso de tristeza vire a mesa.

Coma só a sobremesa. Coma somente a cereja..."

E que bem me souberam!

I love You Porgy - Keith Jarrett

Momentos da vida moderna

Na praia,

à minha frente num cenário paradisíaco, uma cama "chill out" com dois namorados.
Ela agarrada a ele. Ele agarrado ao seu Ipad.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Para os apreciadores de Gin....

....os melhores que bebi até agora em Lisboa,

- Café Buenos Aires na Fábrica
   Rua do Duque, 22
   Chiado

- Orpheu Caffé
   Praça do Principe Real


«Não há-de voltar o verão em que ouvi
cair os ramos naquele bosque de fetos
e eucaliptos; nem o pássaro que por
um instante apagou o sol voltará a
cantar antes de se perder no horizonte.
... Mas voltarei a sentir o que o teu
corpo me fez sentir quando um vento
abstracto nos envolveu de luz, e
depois a sombra caiu, de novo,
com o calor seco daquela tarde.
Mudam-se os tempos, é verdade,
mas não mudamos quando o tempo
corre por entre nós com a sua lenta
música, e num abraço o perdemos
para que o tempo corra sem tempo.
Assim, os nós que o tempo desata
com os seus dedos são os nós que
nos prendem, e com os dedos do verão
os fazemos atar-nos mais ainda,
soltos nós que nesse nó nos solta a voz.»

 Nuno Júdice, Nós (in Fórmulas de uma luz inexplicável), Dom Quixote 2012

Cat Power Wild is the wind


Há muito que deixei aquela praia
de grandes areais, de grandes vagas
Mas sou eu ainda quem na brisa respira
E é por mim que espera cintilando a maré vaza

Sophia de Mello Breyner Andresen

Esta mesa em que escrevo foi pensada
para ter muitos amigos à volta dela.
Podemos encaixar-lhe duas tábuas
torná-la mais comprida.
Haverá mais pratos, mais cadeiras.
... Todas as mesas são pequenas se não contam
com todas as estrelas do céu.
Não mata a fome nenhum pão que não repartas.

Está velha, a mesa. Protesta
chia, range, resmunga
grita, geme, lamenta-se.
Se poisas os cotovelos
se levantas os cotovelos
se estendes a toalha
se tiras a toalha
se sacodes as migalhas,
aqui d'el-Rei que a matam!

Vejam. Toda riscada.
Toda esfolada.
Os golpes, os rasgões. E sob
a pele fina do contraplacado
vemos a carne viva do castanho.
O que não a invalida, notem bem.
Ninguém trabalha melhor do que ela
em questão de talher, de copos, de terrina.
Com a toalha posta
(ou, digamos, depois de maquilhada)
a porcelana de nobreza, os vidros
de bem com a luz, ei-la orgulhosa
da sua condição.
(...)

(excerto de "Divina Música")
Mário Castrim, in "Viagens em casa", Editorial Caminho
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quinta-feira, 14 de junho de 2012

"Todas as mesas são pequenas se não contam com todas as estrelas do céu!"

 Mário Castrim

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Óleo sobre tela: Moonlight on the River, de Lowell Birge Harrison



segunda-feira, 11 de junho de 2012

"Ela tem um sorriso doce, como se brilhasse sob uma luz deslumbrante. E, com esse sorriso, estaria a pensar sem dúvida nessa "outra vez", porque a viu enrubescer pouco a pouco - como se todo o seu corpo se abrasasse com o calor das palavras que ele lhe disse."




sábado, 9 de junho de 2012

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Pat Metheny - The Sound Of Silence!

Escultura em livro: the twelve dancing princesses, por Sue Blackwell



terça-feira, 5 de junho de 2012

JOAQUIM PESSOA, in ANO COMUM (Litexa, 2011)


Dia 231.

... AMO-TE POR TODAS AS RAZÕES E MAIS UMA


Por todas as razões e mais uma. Esta é a resposta que costumo dar-te quando me perguntas por que razão te amo. Porque nunca existe apenas uma razão para amar alguém. Porque não pode haver nem há só uma razão para te amar.
Amo-te porque me fascinas e porque me libertas e porque fazes sentir-me bem. E porque me surpreendes e porque me sufocas e porque enches a minha alma de mar e o meu espírito de sol e o meu corpo de fadiga. E porque me confundes e porque me enfureces e porque me iluminas e porque me deslumbras.
Amo-te porque quero amar-te e porque tenho necessidade de te amar e porque amar-te é uma aventura. Amo-te porque sim mas também porque não e, quem sabe, porque talvez. E por todas as razões que sei e pelas que não sei e por aquelas que nunca virei a conhecer. E porque te conheço e porque me conheço. E porque te adivinho. Estas são todas as razões.
Mas há mais uma: porque não pode existir outra como tu.

 
Óleo s/ tela, Woman Paiting - Hamish Blakely

domingo, 3 de junho de 2012

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Peggy Lee - Black Coffee


 Foi um AMOR que se lhes deu
by Vitor Belanciano

... Não tenho números, dados científicos, mas chega esta altura do ano e é vê-los a separarem-se. Casais, quero dizer. Pelo menos nos círculos por onde me movimento. Parece, assim a modos, que é uma coisa que se lhes dá. Até nas revistas de sociedade, que se alimentam todo o ano do frenético mercado das “separações” e, inevitavelmente, dos “novos parceiros”, a época é de grande abundância

Deve ser da lua, dizem uns. Certamente é do calor, avançam outros. Decididamente é porque "a invasão da dopamina que activa os centros de recompensa do cérebro e produz prazer" não está suficientemente estimulada, dirão os que gostam de observar o amor pelo ponto de vista da neurociência.

Mas o argumento mais demolidor é o da "química". Ou "há" ou "não há", alegam com convicção todos, e não se fala mais disso. A "química" é a justificação de tudo e nada. Na minha intuitiva visão é apenas a forma que tendemos a falar dos afectos quando não compreendemos minimamente os afectos.

Vivemos num tempo onde nunca existiu tanta liberdade de escolha de parceiros e a variedade de modelos de relacionamento parece infinito, mas olho em redor e só vislumbro gente desassossegada, insatisfeita, pronta para terminar relações. Nem a malfadada crise económica parece arrefecer os espíritos.

Talvez seja, como diz o conhecido sociólogo polaco Zygmunt Bauman, reflexo de vivermos num mundo cada vez mais desordenado, no qual o amor também passou a ser experienciado de uma maneira mais fragmentada e insegura, de "química" em "química" à procura da combustão ideal, que nunca chegará, inevitavelmente.

Em vez da maratona, que qualquer relação profunda, amadurecida e leal acaba por ser, com harmonia mas também momentos de inevitável conflito, com fases de efervescência mas também de natural acalmia, tantas vezes confundida com monotonia, opta-se cada vez mais por sucessivas corridas de 100 metros, sempre em busca de "recomeçar do zero".

Se uma relação não cumpre o ideal de alguém, já se sabe, regressa-se ao "mercado das relações" e troca-se por alguém menos chato. Ou então, entra-se em novos relacionamentos sem nunca fechar verdadeiramente as portas para outros que se possam insinuar como mais "interessantes" no futuro próximo.

É por isso que estamos inundados de "amizades coloridas" ou de "novos amigos que na semana passada eram namorados", numa profusão de relações sem grande compromisso, nem densidade, que podem ser facilmente suspensas.

Quanto mais fácil se torna terminar relacionamentos, menos motivação existe para negociar ou vencer as dificuldades que qualquer relação sofre.

O que é estranho é que isto acontece com gerações em que o "conhecimento de si próprio" se tornou num valor irrevogável. Mas também numa verdadeira indústria, onde o "conhecimento interior" é praticado à superfície, sem chatices, sem conflito, sem se escarafunchar na merda.

É como aquelas pessoas que compram um gato, porque é muito "fofinho", sem entenderem que todos os dias terão de limpar o cocó do dito.

As relações verdadeiramente intensas exigem constância, conhecimento dos avanços e não temer ocasionais retrocessos. Pertenço a uma geração de gente bem formada, em muitos domínios, capaz de recitar, de um só fôlego, os dez cantos, as 1102 estrofes que são oitavas decassílabas, sujeitas ao esquema rítmico fixo AB AB AB CC, de “Os Lusíadas” de Camões.

Mas quando se trata de pensar os afectos estamos ainda na infância. Deve ser da famosa “química”.

Público 29-6-2011

Billie Holiday - Stormy Weather (1953)

"Em qualquer aventura o que importa é partir, não é chegar"

yann tiersen -Naomi