terça-feira, 30 de junho de 2020
domingo, 28 de junho de 2020
sábado, 27 de junho de 2020
“Todo homem está dividido entre duas necessidades: a necessidade da canoa, ou seja a necessidade de partir em uma jornada e se afastar de si mesmo. E a necessidade da árvore, isto é, do enraizamento, da identidade.
E os homens vagueiam constantemente entre estas duas necessidades, cedendo por vezes a uma, e às vezes a outra; até que um dia eles entendem que é com a árvore que se fabrica a canoa.”
sexta-feira, 26 de junho de 2020
quinta-feira, 25 de junho de 2020
um livro em branco até ao fim.
"Este verão ensina-me
tenho que ser eu a bater no tambor
quando quiser dançar
Este verão ensina-me
a acordar de manhã. Grata. Sozinha.
Este verão ensina-me
que a folha do limoeiro só deita cheiro
quando a desfazemos entre os dedos."
-Ulla Hann- A Sede Entre os Limites
Pintura - John Singer Sargent, Staircase in Capri (1878)
"Como era grande a tua solidão. Tão vasta quanto a minha. Mas por razões ocultas, encontrámos vasos comunicantes. Que nos nivelavam o sentir no que me parecia prometida paz. Esquecia-me de um risco que a experiência submarina assinala a todo o mergulhador: a partir de certa fundura, ele fica exposto aos perigos da chamada embriaguês das profundidades.
Espontaneamente, vinham-nos recordações da infância mais remota. Às vezes parecia-me que estávamos tentando remontar aos nossos primeiros anos de vida sobre a terra, para que o encontro começasse nesses tempos e assim crescesse em sintonia. Era como se tudo o que nós os dois tínhamos vivido separadamente exigisse uma qualquer compensação da perda originada por não termos feito o caminho sempre juntos. Resumindo: devíamos ter nascido ao mesmo tempo, brincado juntos, crescido juntos até nos desvirginarmos mutuamente. E termos prosseguido assim. Pelo menos era desta cor que eu sentia as coisas entre nós.
Naquela intimidade eu entendia o alcance da paixão-relâmpago entre adultos: faísca formidável ateando um incêndio que altera tudo. E vinha mais esta descoberta: era como se só agora eu entrevisse a razão de haver uma maneira física intensíssima para relacionar duas pessoas. E - num crescendo desse estar-com - dava comigo, estupefacto, no limiar da invenção do sexo. A partir de tal aprendizagem, tomava consciência horrorizada do que cada ser humano desperdiça (irremediavelmente) na relação sexual à toa.
(...) Tenho passado a vida a tentar despir-me até não ter medo de ficar nu."
Nuno Bragança - Square Tolstoi
A intimidade não se pode forçar. Os homens, em geral, encontram aqui maiores dificuldades do que nós, estando geneticamente programados para se sentirem sempre atrasados para uma qualquer tarefa prática que ficou por fazer, mesmo ainda não sabendo qual seja. São incapazes de passar três dias e três noites a comer frutos secos e beber vinho fresco, estendidos sobre os colchões e as almofadas que se retiraram de cima das camas e dispuseram à volta das janelas do quarto de onde só se vê o céu e a lua a passar, fazendo tudo o que há para fazer, que é pouco, mas muito devagar. É de longe mais preciosa a sabedoria das mulheres do que a inteligência dos homens. Os homens não param enquanto não dão cabo de tudo. Desde cedo o seu jogo preferido é brincar às guerras, passatempo que mais tarde se transforma em hecatombe de corpos e almas inocentes. Afastam o tédio destruindo e voltando a construir para poder destruir de novo e assim se escreve a História da Violência que nos ensinam nas escolas. As mulheres preservam o que importa, pois que é nelas que tudo nasce.
Em vez de adiantar, atrasar o prazer. Em vez de consumir, repetir as delícias, sempre numa ordem surpreendente. Em vez de querer passar ao que se segue, estacar, olhar como quem contempla, penetrar por momentos na eternidade dos corpos. Ser íntima era precisamente o inverso daquilo que eu sentia quando estava contigo. Mesmo descontando os beijos. A intimidade não existe, nem começa ou acaba, quando nós queremos. Nem sequer por que amamos: ela não é uma consequência do amor, é o que acompanha o suave e terno trabalho do amor. Um acompanhamento, se tu quiseres, no sentido musical, mas também pode ser no sentido gastronómico, agora que penso nisso, já que o sexo pode ser elevado a alimento divino, néctar para beber e ambrósia para morder. A intimidade é uma plenitude e uma inexcedível satisfação que nada requer ou produz, valendo por si, frágil e intocada, tremendamente humana: um escândalo no mundo letalmente tecnológico dos atarefados. Uma manifestação de anarquia que põe em perigo a existência social dos animais gregários que preferem apenas sobreviver a ousar qualquer alternativa. A intimidade é a poesia dos amantes abraçados de amores.
Pedro Paixão
Pedro Paixão
quarta-feira, 24 de junho de 2020
segunda-feira, 22 de junho de 2020
domingo, 21 de junho de 2020
quinta-feira, 18 de junho de 2020
quarta-feira, 17 de junho de 2020
terça-feira, 16 de junho de 2020
David Mourão-Ferreira
24.02.1927 - 16.06.1996
24.02.1927 - 16.06.1996
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
David Mourão-Ferreira, in 'Matura Idade'
domingo, 14 de junho de 2020
Alguém diz com lentidão:
“Lisboa, sabes…”
Eu sei. É uma rapariga
descalça e leve,
um vento súbito e claro
nos cabelos,
algumas rugas finas
a espreitar-lhe os olhos,
a solidão aberta
nos lábios e nos dedos,
descendo degraus
e degraus e degraus até ao rio. Eu sei. E tu, sabias?
Eugénio de Andrade,
“Até Amanhã"
“Lisboa, sabes…”
Eu sei. É uma rapariga
descalça e leve,
um vento súbito e claro
nos cabelos,
algumas rugas finas
a espreitar-lhe os olhos,
a solidão aberta
nos lábios e nos dedos,
descendo degraus
e degraus e degraus até ao rio. Eu sei. E tu, sabias?
Eugénio de Andrade,
“Até Amanhã"
sábado, 13 de junho de 2020
Uma cidade pode ser
apenas um rio, uma torre, uma rua
com varandas de sal e gerânios
de espuma. Pode
ser um cacho
de uvas numa garrafa, uma bandeira
azul e branca, um cavalo
de crinas de algodão, esporas
de água e flancos
de granito.
Uma cidade
pode ser o nome
dum país, dum cais, um porto, um barco
de andorinhas e gaivotas
ancoradas
na areia. E pode
ser
um arco-íris à janela, um manjerico
de sol, um beijo
de magnólias
ao crepúsculo, um balão
aceso
numa noite
de junho.
Uma cidade pode ser
um coração,
um punho.
Albano Martins
sexta-feira, 12 de junho de 2020
«Há a tentação de escrever um texto inabitável, uma espécie de mapa solitário e limpo, diante do qual o engenheiro da fábula não possa maquinar o seu empenho de aventura humana, com as palavras: aqui fica uma rua, aqui uma ponte, aqui um parque, aqui a mancha cerrada de sentimentos e ideias com o nome de bairro de gente.
Antes da escrita, alguém disse: um momento, engenheiro — eu amaria uma superfície destituída de enigmas, aonde ninguém chegasse, onde não houvesse uma casa paterna, sobretudo, e a perpetração da parábola do filho pródigo.
É um texto que se destina à consagração do silêncio, a gente já pensou tanto, já teve mãos por tantos lados, já dormiu e acordou — bom seria imaginar o espírito apaziguado, a reconciliação do pensamento com a matéria do mundo.
Mestre, não me dês um tema.
E então o texto principia a ser ferozmente habitado.
[…]»
Já entre nós "Apresentação do Rosto" de Herberto Helder.
segunda-feira, 8 de junho de 2020
domingo, 7 de junho de 2020
daniel faria / homens que são como projectos de casas
Homens que são como projectos de casas
Em suas varandas inclinadas para o mundo
Homens nas varandas voltadas para a velhice
Muito danificados pelas intempéries
Homens cheios de vasilhas esperando a chuva
Parados à espera
De um companheiro possível para o diálogo interior
Homens muito voltados para um modo de ver
Um olhar fixo como quem vem caminhando ao encontro
De si mesmo
Homens tão impreparados tão desprevenidos
Para se receber
Homens à chuva com as mãos nos olhos
Imaginando relâmpagos
Homens abrindo lume
Para enxugar o rosto para fechar os olhos
Tão impreparados tão desprevenidos
Tão confusos à espera de um sistema solar
Onde seja possível uma sombra maior
daniel faria
homens que são como lugares mal
situados
quinta-feira, 4 de junho de 2020
quarta-feira, 3 de junho de 2020
Mnemónica
A Letra N tem 18 significados na minha lista. É todo um exercício de memória acertar.
Devemos por isso ser precisos, cirúrgicos na hora de anotar mnemónicas.
A graça é que as missivas mesmo com destino errado se adequam aos destinatários.
Devemos por isso ser precisos, cirúrgicos na hora de anotar mnemónicas.
A graça é que as missivas mesmo com destino errado se adequam aos destinatários.
Depois de enviadas, percebemos se foram erros certeiros, o enredo dos encaixes e é deixar fluir.
O arrepio do improviso.
Chegam as respostas. Cartas de baralho para jogar neste puzzle da vida.
Recordo apesar de desmemoriada aquela frase do filme Indiano - A lancheira:
- O comboio errado pode levar ao destino certo.
Nunca sabemos quando vamos estar num abraço pela última vez.
Chegam as respostas. Cartas de baralho para jogar neste puzzle da vida.
Recordo apesar de desmemoriada aquela frase do filme Indiano - A lancheira:
- O comboio errado pode levar ao destino certo.
Nunca sabemos quando vamos estar num abraço pela última vez.
terça-feira, 2 de junho de 2020
segunda-feira, 1 de junho de 2020
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