domingo, 21 de novembro de 2021
A caminho de Viseu indo eu indo eu
Nunca sabemos verdadeiramente porque fazemos certas escolhas.
20 anos depois sem saber ao que ia, regressei...
às casas remendadas,
às couves,
às cabras,
às manhãs geladas,
a duas ruas empedradas,
a mulheres valentes,
em galochas barrentas,
engalanadas, por feixes de lenhos,
e as mãos gretadas.
Covas em montes,
os currais,
o cabrito ao lume,
e no ar limpo,
o cheiro a estrume.
quarta-feira, 10 de novembro de 2021
terça-feira, 9 de novembro de 2021
segunda-feira, 8 de novembro de 2021
domingo, 7 de novembro de 2021
sábado, 6 de novembro de 2021
Triptico
Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
– eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.
Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
– E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
– não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.
Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço –
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave – qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,
que te procuram.
Herberto Helder
A vida toda desfocada
Sábado,
o meu dia preferido e mal dei por ele.
Apesar das poucas horas de sono acordei cedo.
Partida nas costas, nem se percebe como nos chegam certas dores.
Crescimento espontâneo como tudo a que temos direito depois dos 40.
Era uma massagem por dia, mas fico pelo banho quente à la Madeleine.
Reparo que ganhei também mais uma dioptria durante a noite.
Faz anos em Évora amanheci desfocadíssima e acompanhada por uma tarântula no tecto.
Sim, uma tarântula.
Aqui na grande cidade nem tarântulas.
Ao mercadinho do bairro nem fui.
Na mira, tinha o café dos brasileiros.
Saio de casa com a ideia-desejo de um bolo de Fubá anunciado na porta.
Nem bolo, nem bola, nem açai, nem mandioca, nem doce de leite, nem coco.
COMO é possível???
Começa.
Uma montra igual a tantas outras. Bolos mais enrugados que eu. Nem valem o crime.
Bebo um café e um sumo de acerola, sem me calar, furiosa com a publicidade enganosa.
Resolvo ir ao Oculista, ver se já chegaram as minhas lentes quase bifocais mas nem tanto.
Não sendo o dia ideal para afinações óticas, com a vista num fanico, achei melhor nem dizer nada, fora lentes velhas e aceno que estou a ver muito melhor.
O oculista diz que tudo na vida se experimenta em três dias. Ao fim de três dias temos o resultado, se serve ou não serve. Segunda saberei.
O anel de ouro é que me deve ter deixado de servir, caiu do dedo para o estendal do vizinho.
Baixo ao vizinho, de sorriso amarelo digo que emagreci, caíram meias e anéis.
Subo com tudo recuperado, no meio dos azares há horas de sorte.
Requento as migas, bebo o vinho,
Preparo os olhos para a sesta e as amigas começam a ligar, pergunto mal humorada como ainda não sabem que não são horas para conversetas.
Anulo o Teatro.
Perco o cinema, e a paciência na troca de chamadas com a Carminho.
Senti hoje os primeiros frios até aos Ossos.
Procuro Sol, sento-me num banco esfarelado a fazer tempo, ver se me aqueço e esqueço,
a dance party Rita.
Sono,
mas melhor nem me deitar.
Chega de metamorfoses, até Domingo lamento.
Fico em casa e quieta.