Dizes que a voz se transforma e cria imagens. Eu penso na pintura e em grandes telas a óleo. No cubículo fazem-se milagres. A voz expande-se. O universo expande-se. Há um relojoeiro cego, um ladrão de arte e um guarda de museu. Bebem uísque frio, puro com nuvens.
Toda a grandeza num grão de mostarda, todo o tamanho numa partícula, todas as escrituras numa anedota de bar. Dizes que um sorriso muda o mundo. E um pássaro sagaz morre nesse instante contra o vidro.
No quarto em rectângulo agudo o amor levita. Circum-navegações. O mar prolonga-se, as gaivotas roubam joias em condomínios fechados. As mulheres cumprem a sua sina vegetal, a lua inventa-as todas as noites.
Quatrocentos reclusos furaram o cerco e são felizes, o céu confina-se em arame farpado e subsistem conchas com vozes dentro.
Dizes que a voz aquece. A atmosfera aquece. O mundo esquece-se. Toda a pequenez no oceano roubado por navios calados, luzentes.
No pátio em quadrado macio fazem-se maravilhas. A perfeição avizinhou-se do sonho com grandes asas de cristal e olhos de ferro. Há um tenente da Marinha, um adicto do sol poente e um palhaço trémulo.
Bebem cicuta pura, e limões agrestes laminados; homens bomba com cinturas estreitas ameaçam a manhã, fumam-se cigarras.
Dizes que me amas e não o dizes senão quando é segredo. A minha voz lateja, convoca mundos.
Na linha da praia, contínua, fazem-se noites e relentos. Místicos adiposos morrem de medo junto às paredes.
Eu penso na luz e nos mistérios luminosos, telas vazias, biombos cheios de luz. Há ondas sonoras cheias de sal e de tainhas e de surfistas. Toda a areia num grão de universo.
Bernardino Guimarães
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